A psicoterapia não se esgota no tempo da consulta. A consulta representa o encontro dos intervenientes e a concretização manifesta da relação terapêutica num determinado momento, mas muito pode acontecer de potencialmente terapêutico entre sessões.
Muito pode começar antes do início de um processo terapêutico, quando a pessoa sente a necessidade de pedir ajuda e de embarcar nesta viagem. Esta indagação favorece por si só momentos introspetivos e reflexões importantes – um olhar interno sobre si, sobre as suas necessidades e apelos à descoberta. Desde a procura pelo terapeuta, a busca pela pessoa e abordagens preferenciais, a antecipação do investimento pessoal, até à passagem por questões relacionadas com o propósito e perspetiva de sucesso deste encontro.
Nesta procura pelo lugar certo, podem acontecer alguns desencontros e surgir a necessidade de rever opções e gerir expectativas, e também isto acrescenta bagagem potencialmente criativa e alusiva à singularidade deste processo. Com mais ou menos desvios no percurso, as consultas acontecem e a relação terapêutica ganha margem para se estabelecer.
Os momentos fora das sessões representam aspetos importantes e com significado terapêutico. A viagem para o consultório, o caminho para lá chegar e a antecipação da consulta na sala de espera são preâmbulos mediadores do encontro que se espera com hora marcada. Antes da consulta a conversa já começou internamente, nas possíveis contemplações e indagações, tópicos, dúvidas ou vazio, à espera de serem acolhidos.
Os eventuais imprevistos, por vezes incontornáveis, e a forma como são geridos e resolvidos entre as partes desta relação, também têm lugar para serem elaborados – talvez também por isso o contrato estabelecido no início de uma psicoterapia seja denominado de “contrato terapêutico”.
A viagem de regresso após a consulta é muitas vezes o momento de digestão mais imediato – consciente ou não – do que aconteceu naquele momento tão particular. Um epílogo que contempla o que ecoa e fica dentro, alívio ou turbulência. Também o tempo que se estabelece até à próxima consulta é lugar para esta metabolização, de sensação de permanência interna da relação terapêutica perante a ausência concreta, do dito e não dito, da certeza do próximo encontro e da singularidade daquele lugar e daquela relação.
Os interregnos mais prolongados, e previstos na psicoterapia, podem também ser objeto de contemplação pelo tipo de reações e emoções que despertam e se fazem sentir, pelos diálogos internos que muitas vezes acontecem. Entre consultas, a terapia continua: no mundo interno, nos sonhos, nos desafios do quotidiano, no que se guarda dentro e permanece, e no tempo e ritmo que as coisas levam para nascer e crescer.
*escrito com acordo ortográfico, por escolha do autor.